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segunda-feira, 9 de setembro de 2013

JARDIM DE VÁRIOS UMBIGOS




“No dia em que o umbigo da criança caía, a parteira, madrinha de todos os nascimentos, o enterrava em lugar escolhido. Se no jardim com flores, a menina seria bela e boa jardineira; se na horta, o menino seria lavrador e, se no curral, boiadeiro. O destino era assim escolhido sem outros inúteis anseios. Assim sendo, nascer era tão bonito que acreditar em outra vida era coisa muito simples [...]”.

                               Trecho do livro Indez, primeiro capítulo, de Bartolomeu Campos de Queirós.

Jamais me ocorreu plantar, regar e esperar pacientemente qualquer coisa brotar na terra, e a julgar pelo meu talento nesta área e minha imaginação desgovernada, haveria grandes possibilidades de que eu ficasse por meses à espera de uma árvore de anzóis com flores de peixe beta. E aposto que você concorda que seria uma linda e improvável árvore. 
Dito isto, reconheço ser uma irresponsável botânica, cuja ação de cultivar flores se dilui no meu cotidiano de esquecimentos em no máximo três ou quatro dias.
Mas então, imagine como seria ver o amarelo nascer, plantar uma pequena semente na expectativa de uma cor.
Recentemente perdi um objeto com ilustração de uma grande obra de arte do século XIX, chamada "Os doze girassóis", era um desses objetos ao qual atribuímos memória e sentimentos, e que eu nomeio de objetos de uso emocional. Essa perda me fez refletir sobre o valor das coisas. Não o preço cobrado por elas, mas o quanto elas valem para nós.
Após esse episódio, recebi de um amigo artista que possui forte identificação com a terra, a promessa de que cultivaria girassóis para mim, de modo, que o figurativo se reconfiguraria no literal através de uma ação processual que se apresenta no verbo: cultivar.
Ele prepara a terra, planta e espera o tempo da flor, com uma dedicação e esperança familiar de alguém que veio de uma cidade pequena, e conhece muito bem o som da terra germinando.
Eu, de modo quase infame, elaboro minha construção mental deste jardim de um vaso só, mas com predisposição para o afeto, e assim, simbolicamente exercitamos a desaceleração do tempo e a construção coletiva de ações cotidianas ou simplesmente o cultivo de um ou quem sabe vários girassóis. 
Esse gesto se configurou em uma proposição artística com aproximações que se dão enquanto compartilhamos uma ESPERA em comum, mas também é uma experiência de vida mediada por uma ação do dia-a-dia.
Á priori existia a expressa intenção de dar uma forma orgânica às lembranças que foram embora com aquele objeto perdido, ao mesmo tempo em que prevíamos um encontro de modo mais sensorial e menos descritivo. 
Deste modo, estivemos aqui, diariamente a plantar memórias e construir diálogos entorno deste pequeno vaso, que a principio apenas soube que dividiria espaço com uma flor de manjericão roxo e que desde os primeiros dias já se curvaria em direção ao sol. Assim nasceu este jardim, regado com água, afeto e esperança matinal, e se, apesar dos esforços, nenhuma flor brotasse, dizíamos que ainda assim teríamos um jardim.

A Obra:
Em tempos cada vez mais freqüentes de substituições do real pelo virtual através de jogos virtuais de imitação da vida, surgiu este Jardim como mediador de uma distancia geográfica, que se dá pela via do afeto, em pontes invisíveis que nos conecta a espaços de convívio afetivo e nos mantém entre lugares como um ambiente comum aos dois. Ele nasceu pelo desejo de interlocução com o Outro, interpelado pela urgência das relações humanas, de maneira que se configura em outro modo de lidar com o tempo e a espera, operando no exercício do cotidiano, através da metáfora do jardim: O cultivo, a espera, o florescimento.
Este Jardim ainda está sendo cultivado, e dado o fato de que é um trabalho que envolve um processo natural que independe de nosso tempo para executá-lo, sabemos que ainda serão incorporadas a esta coleção de imagens, de 8 a 10 imagens e/ou textos, assim como sabemos que possivelmente até a abertura da exposição esse Jardim chegará ao limite de seu florescimento e conseqüente extinção, visto que o jardim terá um fim, uma vez que se trata de um tipo de “planta caduca”, ou seja, é um tipo de jardim que perece logo após florescer. 


O Jardim:


 


                                                                                 Jardim de vários umbigos. 2013



Os cadernos de:
Bebeto Bahia Duarte e Carla Evanovitch são parte integrante desse trabalho e foram elaborados durante a espera pela chegada do Jardim ao longo de quase três meses de conversa via rede social.
(em breve, os cadernos estarão disponíveis nesta página)

Projeto Expográfico:







quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Performações. Exposição Gesto Amplificado. Caixa Cultura. RJ /SP. 2012

"Carla Evanovitch se coloca em 3ª pessoa, pede distancia e inicia uma investigação do urbano a partir de personagens comuns. Ela realiza coleta de panfletos postos em circulação pelas grandes cidades todos os dias, para logo em seguida modificar a autoria. Com esse procedimento, a artista se torna investigadora/sujeito, flertando com os papéis da sociedade em que vivemos. E já que toda necessidade é sincera, fica a pergunta: Até onde se pode chegar por um objetivo? Quais as leis?" (Alê Souto - Curador da Exposição)

 

Performações Urbanas. Caixa Cultural, exposição Gesto Amplificado, São Paulo. 2012 

 

Performações Urbanas. Caixa Cultural, exposição Gesto Amplificado, Rio de Janeiro. 2012 

CLIQUE aqui e assista todos os vídeos da artista

Gesto Amplificado

Caixa cidade, espaço onde a voz se perde. A coletividade e seus desejos superam o eu e a individualidade se perde em meio aos escombros da construção de algum prédio público novo. Sim, existe movimento em meio aos escombros dentro da caixa cidade. Seguro uma pedra e atiro em direção ao asfalto, ela bate em um muro e resvala na grade embaixo do viaduto. Uma simples pedra, jogada assim ao acaso pode gerar mil conexões dentro da caixa cidade. E se, imaginamos esta mesma pedra atirada longe, mais longe e depois mais longe ainda, atingindo diversas caixas cidade, e se, a cada vez essa pedra abrisse a tampa de cada uma delas fazendo um click na tampa de cada caixa, mostrando o que há dentro delas, desvendando diante de nossos olhos suas cores, sons, mistérios e personagens?Gesto Amplificado é ao mesmo tempo a mão e a pedra atirada longe. Enquanto o trajeto da pedra se faz, existe tempo de resposta, e é fato que algumas caixas cidade não se abrem com tanta facilidade e precisam ser constantemente clicadas, e aí sim como num passe de mágica, zzzaaaaap!!! Está diante de nossos olhos seu recheio. Algumas vezes o recheio de uma caixa cidade pode ser bastante estranho, ou cheirar mal. Mas quem mandou jogar a pedra?Então vejamos a seguinte equação: caixa + pedra + click + tempo de resposta = recheio. Isso! um recheio composto daquilo que somos e o que sentimos. Bem, seria quase isso. Mas, voltando a ideia da pedra, me lembro do trajeto e das curvas que ela faz quando vai e vem, ativando os clicks e abrindo as caixas. E os barulhinhos? Sim, faz um barulhinho bem discreto quando uma caixa cidade se abre. O quê? Vai me dizer que você nunca ouviu? Sério?
Alê Souto 
Curador




  Caixa Cultural, Exposição Gesto Amplificado. 2012 - RJ/ SP

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